Leia aqui o edital de licitação.
O Supremo Tribunal Federal (STF) anunciou a abertura de uma licitação para contratar uma empresa que será encarregada de monitorar as redes sociais sobre conteúdos que envolvam a Corte. O valor do contrato, segundo o edital, é de 345.000 reais e prevê duração de um ano. A iniciativa surge no momento em que a Corte vem intensificando, ano a ano, o combate à disseminação de notícias falsas e ataques que sofre na internet.
O Supremo quer saber tudo que se fala sobre ele nas redes sociais. A empresa que vencer a licitação fará um acompanhamento ininterrupto do Facebook, Twitter, Youtube, Instagram, Flickr, TikTok e Linkedin.
O trabalho envolverá ainda a análise da imagem do Supremo, a identificação de assuntos relevantes abordados pelos usuários e a classificação do material. A empresa também terá a responsabilidade de identificar quem são as pessoas que estão compartilhando os conteúdos — especialmente os autores de menções negativas.
Monitoramento inclui georreferenciamento
O STF solicita no edital que a empresa contratada utilize uma ferramenta específica no trabalho de monitoramento. Ela precisa ser capaz de “identificar públicos, formadores de opinião, discursos adotados, georreferenciamento da origem das postagens, bem como avaliar a influência dos públicos, dos padrões das mensagens e de eventuais ações organizadas na web”.
Os ministros vão receber relatórios com balanços diários, semanais e mensais, identificando os formadores de opinião que debateram assuntos relacionados ao Supremo, com análise de seu posicionamento e sua capacidade de repercussão. O trabalho deve conter ainda uma avaliação geral do impacto da mobilização em torno de temas relacionados à Corte, com avaliação de seus reflexos na opinião pública.
Além dos dados precisos sobre a imagem da Corte no universo digital, a ferramenta deve inibir a difusão de ameaças feitas aos ministros. Os dados colhidos, se for o caso, poderão ser compartilhados com a Polícia Federal.
Em nota, o Supremo informou que a licitação tem como objetivo compilar conteúdos públicos divulgados nas redes sociais sobre a Corte, a exemplo do que outros órgãos da administração pública também fazem. “Trata-se de um serviço para compilar o conteúdo público das redes sociais sobre o STF, assim como já existe o clipping para as notícias dos jornais e dos sites. A consolidação do conteúdo público das redes é feito na maioria dos órgãos da administração pública e orienta os trabalhos da comunicação social, para a definição de temas que devem ser melhor explicados à sociedade, por exemplo”, diz o texto enviado pela assessoria de imprensa do STF.
Esse monitoramento, conforme o próprio STF, vai abranger o Instagram, o TikTok, o Facebook, o X (antigo Twitter), Youtube, Linkedin e até blogs.
A empresa contratada será responsável por entregar “relatórios com alertas (enviados por mensagem instantânea), relatórios analíticos (diário, semanal e mensal com análise quantitativa e qualitativa), boletins eventuais e elaboração de plano mensal de ação estratégica para atuação em redes sociais”, segundo informações do próprio edital de licitação.
Segundo a licitação, que está nesse momento em fase de recurso, a empresa contratada vai monitorar post 24 horas por dia, sete dias por semana ao longo de um ano posts sensíveis ao STF, palavras-chave e temas de interesse do Tribunal d forma a “viabilizar a análise da presença digital do STF nessas mídias”.
Esse monitoramento, segundo o STF, tem como objetivo “mostrar a evolução da imagem do STF, além de indicar os assuntos mais relevantes abordados pelos usuários, classificação dos registros (positivo, negativo e neutro), identificação das principais fontes influenciadoras e detratoras e sugestão de aprimoramento da comunicação com esses públicos”.
Em nota oficial, o STF disse que o serviço é complementar ao da clipagem de jornais e revistas.
“Trata-se de um serviço para compilar o conteúdo público das redes sociais sobre o STF, assim como já existe o clipping para as notícias dos jornais e dos sites. A consolidação do conteúdo público das redes é feito na maioria dos órgãos da administração pública e orienta os trabalhos da comunicação social, para a definição de temas que devem ser melhor explicados à sociedade, por exemplo”
Quando vai ser esse monitoramento do STF?
Ainda conforme o certame, os relatórios serão entregues às 8h da manhã e às 22h. Além disso, estão previstas as entregas de análises diárias, semanais, mensais e planos de ações mensais.
A iniciativa do STF vem no bojo de um acordo feito há aproximadamente duas semanas em que representantes das plataformas YouTube, Google, Meta (que controla Facebook, Instagram e WhatsApp), TikTok, Microsoft e Kwai firmaram com o Supremo para combater a desinformação.
O X ficou de fora desse acordo.
Conforme o STF, esse protocolo prevê a prevenção de “práticas que afetam a confiança das pessoas no Supremo, distorcem ou alteram o significado das decisões e colocam em risco direitos fundamentais e a estabilidade democrática”.
Em 2022 Carmen Lúcia votou que o monitoramento de redes pelo governo é inconstitucional.
A conduta estatal de perseguir ou investigar, com recursos públicos, as manifestações individuais com o objetivo de adotar comportamentos de cerceamento ou constrangimento às liberdades não é lícita, por contrariar os mais fundamentais preceitos democráticos que presidem o sistema constitucional vigente.
Por isso, é inconstitucional todo e qualquer ato da Secretaria Especial de Comunicação Social do Ministério das Comunicações de produção de relatórios de monitoramento de atividades de parlamentares e jornalistas em suas redes sociais. Esse foi o entendimento da ministra Carmen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, em seu voto no julgamento de ação iniciado na sexta-feira (4/2), no Plenário Virtual da Corte.
No caso, está em exame arguição de descumprimento de preceito fundamental ajuizada pelo Partido Verde contra o monitoramento de redes sociais de 116 parlamentares, levado a efeito pela Secretária de Governo da Presidência da República e denunciado no ano passado.
Na ADPF, o partido informa que o acompanhamento diário de atividades parlamentares e jornalísticas foi noticiado pela revista Época. Segundo a publicação, estima-se que os parlamentares (105 deputados federais, nove senadores, uma deputada estadual e um vereador) tiveram suas redes sociais monitoradas a pedido da Segov.
Ainda de acordo com a reportagem, o ministro-chefe da Segov, general Luiz Eduardo Ramos, considerou absurda a iniciativa e disse que ela não partiu de ordem sua, embora não tenha negado a existência dos relatórios.
Em seu voto, a ministra Carmen Lúcia afirmou que, de acordo com informações prestadas pelo Secretário Especial de Comunicação Social do Ministério das Comunicações, os relatórios de monitoramento de redes sociais foram elaborados por empresas contratadas. A alegação do governo é de que "tais relatórios de monitoramento de redes sociais auxiliam nas tomadas de decisão e servem de subsídios para atuação nas áreas de comunicação do Governo Federal e podem se materializar em produções de conteúdo para os canais Governamentais, realização de campanhas de comunicação, definições de agendas ou outros".
Para a ministra, houve desvio de finalidade dos órgãos governamentais. "Não está entre atribuições da Secretaria Especial de Comunicação — nem seria lícito — a função de monitorar redes sociais de pessoas, físicas ou jurídicas, até porque objetivo dessa natureza descumpre o caráter educativo, informativo e de orientação social que legitimam a publicidade dos atos estatais, conforme disposto no § 1º do art. 37 da Constituição da República", escreveu ela em seu voto.
E completou: "Para além do desvio de finalidade no procedimento de monitorar redes sociais, atitude sem relação de pertinência com os deveres constitucionais e legais fixados à Secretaria de Comunicação e sem respaldo jurídico, está também caracterizada afronta ao princípio da impessoalidade. Esclarecido está no processo que o acompanhamento de redes sociais está direcionado a pessoas — parlamentares e jornalistas — para apurar a sua condição de apoiar ou opor-se ao governo".
Na opinião da relatora, a produção de relatórios de monitoramento de parlamentares e jornalistas afronta também o princípio da moralidade. "Com recursos públicos, ao invés de se dar cumprimento ao comando republicano obrigatório de se promoverem políticas públicas no interesse de toda a sociedade, o Poder Executivo federal valeu-se da contratação de empresa para pesquisar redes sociais sobre a base de apoio — ou oposição — ao governo em posicionamento ilícito e, pior, em afronta direta a direitos fundamentais de algumas pessoas", criticou ela.
Outros argumentos
Na inicial, o PV também argumentou que o monitoramento causa grave lesão ao preceito da liberdade de expressão, da manifestação do pensamento e do livre exercício profissional e relatou que, diante de indícios de desvio de finalidade na contratação de empresa privada, com verba pública, o Ministério Público solicitou que o Tribunal de Contas da União (TCU) apure se a medida atende ao interesse público.
Outro argumento é o de que o STF, no julgamento da ADPF 722, concedeu medida cautelar para suspender qualquer ato do Ministério da Justiça e Segurança Pública que tenha por objetivo investigar a vida de 579 servidores públicos e elaborar relatórios sobre os chamados "antifascistas". Assim, o PV pede também a concessão de liminar para suspender qualquer ato de monitoramento de parlamentares e jornalistas pela Presidência da República.
Clique aqui para ler o voto da ministra Carmen Lúcia
ADPF 765